Por: Pupi Rosenthal
Do Diario de Pernambuco
A saída de Danilo Cabral da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) pode ter sido a novidade desta terça-feira (5), mas é um capítulo de uma história que se arrasta há anos e que envolve disputa de poder entre estados e vontade empresarial. Danilo saiu, é fato, por pressão do PT do Ceará, encabeçado pelo governador Elmano de Freitas com o endosso do ministro da Casa Civil do governo Lula, Rui Costa (PT-BA), e da Transnordestina Logística (TLSA), empresa responsável pela construção do ramal da ferrovia que vai ligar Eliseu Martins, no Piauí, ao Porto de Pecém (CE).
Em um breve resumo da história mais antiga, em 1998, a Malha Ferroviária foi concedida à iniciativa privada à Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Em plena era das privatizações do governo Fernando Henrique Cardoso, o leilão foi feito com a promessa de tirar do papel um sonho antigo da região: unir o Sertão ao litoral através de trens e assim garantir o escoamento da produção, por exemplo, de fruticultura irrigada do Vale do São Francisco ou do polo gesseiro do Araripe.
Por anos, no entanto, nada andou ou andou “para trás”. Depois de décadas sem colocar um prego no projeto, a TLSA decidiu que apenas o trecho que beneficia o Porto de Pecém seria do seu interesse em investir. Para isso, algumas mudanças foram feitas no contrato de concessão no final de 2022, no apagar das luzes do governo Bolsonaro, que excluíram o trecho Salgueiro-Suape.
Outro ponto, foi a garantia de que a empresa receberia recursos públicos para viabilizar o empreendimento. Isso incluiu todo o orçamento, cerca de R$ 1 bilhão por ano, do Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE) dos anos de 2024, 2025 e 2026, além de outros R$ 600 milhões de 2027.
O fundo, então, que serviria para atender aos nove estados da região, ficou comprometido com um único projeto de um único estado. Mesmo assim, recentemente, o governador do Ceará, representantes da TLSA, Rui Costa e outros nomes aproveitaram uma viagem de Lula a Pecém para reclamar de uma suposta demora da Sudene em garantir a liberação dos recursos.
Nesse momento, entra em cena a rivalidade do Ceará com Pernambuco em torno dos recursos dos fundos de desenvolvimento da região. Não só o FDNE, mas principalmente o Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE) – que tem um orçamento de R$ 47 bilhões para este ano. A definição sobre a aplicação dos recursos do FNE sempre ficaram nas mãos da Sudene, com sede em Pernambuco, e a sua operação com o Banco do Nordeste (BNB), com sede no Ceará.
Ao longo da história, os cearenses sempre forçaram a barra para ficar com o comando do BNB. Isso até 2023, quando Lula decidiu escolher o ex-governador Paulo Câmara para ocupar a vaga.
Claro que os cearenses não engoliram bem a indicação de um pernambucano para o cargo. Mas Paulo acabou conquistando os atores cearenses e, hoje, não há restrições ao seu nome, inclusive pelos bons resultados que o BNB vem apresentando.
Por outro lado, a Sudene, apesar de sediada no Recife, foi comandada por nomes de vários estados, a exemplo do ex-governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima. Isso até a extinção do órgão pelo governo Fernando Henrique Cardoso, em 2001. Em 2003, ao assumir seu primeiro mandato como presidente, Lula garantiu que iria retomar a Sudene como havia prometido em sua campanha. Com pompa e circunstância, realizou um evento, justamente em Fortaleza, para anunciar a volta da Sudene ao lado do seu então ministro da Integração, Ciro Gomes, e do criador do órgão, o economista Celso Furtado.
Mas a Sudene jamais voltou a ter a importância de antes. Tornou-se um órgão muito mais burocrático do que planejador e balizador de políticas públicas para a região como foi em seu auge.
Ao assumir o posto de superintendente, Danilo Cabral tentou mudar essa realidade. Trabalhou para retomar o diálogo com setores produtivos e comunidade acadêmica, discutiu diretrizes e lançou editais voltados a públicos específicos como jovens e mulheres.
Não foi à toa que, desde que saíram as primeiras notícias da sua possível saída, recebeu cartas de apoio de entidades de toda a região. No entanto, ele esbarrou na insatisfação do Ceará com a possível retomada do trecho pernambucano da Transnordestina. Caso ele seja viabilizado, haverá um aumento no volume de carga movimentada por Suape que, em 2024, chegou a 24,8 milhões de toneladas, enquanto Pecém registrou 19,6 milhões de toneladas.
Em uma luta fratricida que sempre marcou os dois estados, dessa vez, Pernambuco saiu perdendo, apesar do seu substituto ser outro nome do estado: Francisco Ferreira, militante do PT e segundo suplente da senadora Teresa Leitão, do mesmo partido. Lembrando que Danilo é do PSB e foi indicação do também senador Humberto Costa (PT). Por isso, agora, é esperar o próximo capítulo.