Por: Mauricio Rands
Fosse fácil de resolver, o problema das mudanças climáticas não demandaria tanto esforço e mobilização. Os participantes da COP 30 em Belém nunca tiveram ilusão de que existam soluções mágicas imediatas. Tanto que a ONU já está em sua 30ª conferência sobre o clima. Mas os negacionistas de sempre novamente estão a postos. Negam que o aquecimento é consequência de ações humanas. Negam que as mobilizações sociais tenham qualquer efeito. E prosseguem a negar que as políticas públicas discutidas nessas conferências da ONUtenham produzido qualquer resultado. Não por coincidência são os mesmos que negam a ciência e as vacinas. Os mesmos que, na questão da segurança, vendem a solução fácil do “bandido bom é bandido morto”. Populistas da ignorância.
Não percebem que o desenvolvimento das energias renováveis não surgiu do nada. São esses negacionistas que se apressam a dizer que “essa Cop 30 não vai dar em nada”. Seja porque os EUA não participam e se negam a financiar qualquer iniciativa. Seja porque os consensos plenos são sempre difíceis. E aí visam desviar o foco dos desafios que estão sendo negociados em Belém. Passam a criticar o preço da hospedagem, o absurdo de uma coxinha de galinha a R$ 30,00 ou o pouco efetivo de seguranças para reprimir os movimentos sociais. Como se a lei da oferta e procura não produzisse abusos similares na noite de ano novo em Times Square ou em Paris.
Esses negacionistas não enxergam o papel crucial dessas conferências climáticas para uma série de conquistas que já são realidade. Desconhecem que o declínio vertiginoso dos custos das energias renováveis foi possível por causa das políticas públicas discutidas nessas conferências. Que, por sua vez, decorreram de um processo de conscientização ambiental que tem nas conferências climáticas um grande fator de impulsionamento. Que desenvolveram a ambição climática para voltarmos à meta de 1,5º C acima da temperatura pré-industrial.
Essa de Belém tem a participação de 197 países, mais de mil movimentos sociais e 56 mil inscritos que fizeram a bela marcha mundial pelo clima com 70 mil participantes no sábado, dia 15/11. Dos quais 3 mil indígenas. Os temas geram coalizões e divisões sobre financiamento, adaptação climática e criação de um “mapa dos caminhos” para eliminar os combustíveis fósseis.
Debatem-se soluções para os nossos biomas (Amazônia, Cerrado, Pantanal, Caatinga, Mata Atlântica e Pampa). Ou soluções para mitigar as maiores cargas que essas mudanças do clima descarregam sobre os povos originários e as populações mais pobres do planeta. Ou para acelerar a transição energética para um futuro sem combustíveis fósseis.
A tensão sobre o financiamento é o coração das negociações e, mesmo sem os EUA, é preciso paciência para chegar a acordos. China e Índia disputam com os europeus a conta do aquecimento global. A União Europeia argumenta que árabes, chineses e indianos podem contribuir mais. A Arábia Saudita, emulando a atitude dos EUA de Trump, recusa-se a contribuir.
Na COP 29, em Baku, tinham sido definidos US$ 300 bilhões para adaptação de várias fontes, inclusive empréstimos.Agora, os países em desenvolvimento, reunidos no G77 (hojemais de 100 países, incluindo a China), querem triplicar o valor,e discutir quanto da bolada será de doações ou empréstimos a juros baixos de países ricos para países em desenvolvimento, entre eles os africanos.
O presidente Lula foi inspirado ao denominar essa COP 30 como a “da implementação”. O “mapa dos caminhos” a serem percorridos. É engenhoso o mecanismo de financiamento proposto pelo Brasil para ajudar os países a manterem de pé as suas florestas. Um fundo de investimentos que vai gerar retornos aos países investidores, mas com spreads transferidos para ações em defesa de florestas como a Amazônica, a da Indonésia e a do Congo. Bom que já se tenham comprometido a aportar fundos o Brasil, a Noruega, a França, a Inglaterra e a Alemanha. Outros virão.
A COP 30 em Belém tem um significado adicional. Pela primeira vez é realizada no local onde está uma das florestas mais decisivas para o futuro climático do planeta. A intensa participação popular desta feita juntou autoridades, ativistas e a população em geral. Nas noites da COP30, após aas reuniões e eventos, os participantes encontram-se nas ruas, bares e restaurantes de Belém, uma cidade com cultura própria.
Diferente das últimas sedes, onde o mundo exterior era bloqueado em função do evento. Brasileiros e estrangeiros em integração cultural ao som do tecnobrega do crocodilo, do rap ou do carimbó. Ao sabor do açaí, do jambu, do tacacá e do tucupi.
Maurício Rands, advogado formado pela FDR da UFPE, professor de Direito Constitucional da Unicap, PhD pela Universidade Oxford